Uma indígena vivia em regime análogo à escravidão, trabalhando para um casal, no Centro de Sorocaba. O Ministério Público do Trabalho (MPT) resgatou a jovem que só descobriu a situação que estava vivendo quando começou a estudar. Além da jornada de trabalho sem descanso ou férias, sofria assédio sexual do patrão, conforme denunciou.
A jovem indígena era mantida pelo casal, desde 2021, quando veio do Amazonas, iludida por um anúncio de trabalho que não exigia experiência. Ela disse à TV TEM, que só entendeu a situação análoga à escravidão de que estava sendo vítima após comentar sobre a situação com colegas do curso que fazia em Sorocaba.
"Não sabia como funcionava essa coisa de pagamento, trabalho. Eu fui saber quando comecei o curso, que eu conheci as meninas que estavam junto comigo. Elas começaram a me falar como funcionava, como tinha que ser. Até então, pra mim, era normal o que eles me pagavam", disse a indígena, na entrevista à TV.
A situação só foi comprovada depois de uma denúncia feita pelo Conselho Tutelar ao MPT. Uma força-tarefa foi montada para investigar a situação, e a indígena de 21 anos foi acolhida em uma ONG.
Em um acordo com MPT, o casal vai pagar R$ 20 mil por manter indígena em condições análogas à escravidão. Ela trabalhava como babá e empregada doméstica ao mesmo tempo. Dormia em um colchão no piso de um quarto destinado a quardar brinquedos.
NA ALDEIA - A moça disse que vivia na aldeia Cartucho, no noroeste do Amazonas, e sua mudança para Sorocaba se deu com a promessa de um emprego com carteira assinada, como babá. Ela disse que foi atraída por um anúncio do Facebook, de um trabalho que não exigia experiência.
"Eu vim sem saber de nada, mesmo. Lá, onde eu moro, não existe muita maldade, sabe? As pessoas confiam muito um no outro, assim. Então, você não vê malícia em ninguém", diz.
A jovem disse que usava o dinheiro que recebia para pagar a mensalidade do curso de técnica em enfermagem, além de apostilas e outras despesas. Sem mais recursos, ela dependia de amigas para pagar o transporte e lanche.
ASSÉDIO - Segundo o Ministério Público do Trabalho, ao chegar em Sorocaba para trabalhar, a jovem se deparou com uma situação completamente diferente da qual havia sido prometida a ela. Não havia, por exemplo, o registro em carteira e o pagamento integral do salário prometido.
A investigação apontou que a jovem tinha jornadas exaustivas, sem horário fixo para trabalhar, além de não ter tirado férias no período em que ficou na residência, um apartamento no centro da cidade.
Foi apontado também que ela dormiu no chão, de forma improvisada, e que tinha de atuar como babá e empregada doméstica ao mesmo tempo, inclusive, aos finais de semana.
De acordo com a jovem, os assédios do marido da patroa a motivaram a aceitar ajuda. "Eles falam, agora, que fui explorada. Eu cheguei a falar pra ela que tinha medo dele. Eu tinha [medo]. É triste pra mim", diz emocionada.
"Como estava morando na casa deles, fazia o que tinha que fazer. Dormia em um colchão, no chão, que era no quarto de brinquedos", conta ainda.
"Meu pai é uma pessoa que está sempre à frente, defendendo o povo indígena, o direito que o povo tem. Meu pai disse que poderia me ajudar só até o terceiro ano. Ele falou 'agora depende muito de você'", diz.
Mesmo após todo o acontecido, ela garante que vai continuar estudando e que pretende, futuramente, fazer um curso de nutrição.
"Vou até o final. Vim aqui para estudar. Vim com essa intenção de ajudar o meu povo, que a condição lá não é tão boa."
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